Parte 2

Nierom foi vestido com um grande e folgado manto escuro com capuz, amarrado na cintura com um cordão. Para quem o vê na rua, trata-se apenas de um peregrino ou servo qualquer. Dentro da roupa foi possível esconder com facilidade o punhal e os três frascos da poção mágica, mas não mais do que isso. Um serviço foi bem feito tentando esconder as cicatrizes no corpo e no rosto, mas quem o conhece não terá dificuldade em identificá-lo se observar diretamente o rosto, por isso o capuz sempre cobrindo a cabeça.

Tristã confiou um pangaré ao mago, que cavalgou de volta a cidade junto com Bonnie. Atravessar o portão rendeu um tanto de trabalho, pois já era noite e estavam fechados, mas Bonnie soube usar bem algumas ameaças envolvendo o nome do rei e puderam entrar.

Vocês cavalgam em direção ao castelo pelas ruas desertas e escuras da capital. Vez ou outra, uma patrulha da guarda cruza o caminho de vocês, sem fazer perguntas. Apenas as ruas principais estão iluminadas, e as praças de mercado estão desertas. Enquanto não alcançam o castelo, é preciso combinar uma identidade para Nierom.

Você se sente um tanto incomodado no luxuoso aposento de Roderick Karp, tendo que se trocar na frente dele e do maranense que escolhe as roupas que Karp veste.

- Não pode aparecer na presença do rei com essas botas - o maranense desaprova - Veja se essas servem, pelo menos estão limpas.

A você é dado um tabardo, um grande manto que cobre o corpo inteiro, decorado com as cores e o brasão de Verrogar. Você já veste um desses atualmente, porém este está limpo e recém tingido, de melhor fabricação. Uma bainha melhor é cogitada.

Roderick, avulso à questão estética, expõe os fatos claramente a você:

- Você tem sido um bom guerreiro, Thartalion, fez jus a sua escolha nesta comitiva. Seu comportamento volátil até mesmo veio a ser útil nesta ocasião. Esta noite, diante do rei, Arthur irá interpelar ao rei sobre um julgamento a esta questão. Bael não é guerreiro nem nobre, portanto você não tem obrigação moral de duelar contra ele. O rei vai aceitar um duelo até o primeiro sangue para que a questão de honra seja resolvida, é a maneira mais fácil para ele. Arthur provavelmente pedirá para um simpatizante a sua causa que duele por Bael. Eu quero que você ganhe este duelo...

- ... mas se perder, quero que seja desonroso. Ataque o adversário pelas costas depois de encerrada a luta, quebre uma perna ou arranque uma orelha dele. Apostarei alto em você e tanto sua derrota como sua vitória trará benefícios a sua nação. Verrogar se orgulhará de você, meu guerreiro.

As roupas da mala de Lucius serviram bem em você e precisaram de poucos acertos. Anabel está provocantemente vestida e aguarda você para irem juntos até a corte. As garotas da casa fizeram um bom serviço de maquiagem em você e até arrumaram seu cabelo para que ficasse parecido com o do outro bardo. Agora você tem o alaúde e a carta dele e está pronto para a noite tão esperada.

- Aqui, beba um pouco - Earl lhe serve o melhor meelbernil que dispõe, um ótimo relaxante para a voz.

A noite caiu e você deve se apresentar antecipadamente ao castelo. Em sua mente, um milhão de planos borbulham sobre como arrancar cada moeda de ouro daqueles trouxas. Lucius vocifera do alto do seu barril:

- Impostor miserável! O mundo saberá disso e seu nome será escárnio por todo lugar que passar! Eles descobrirão sua farsa!

No quarto de Arthur, vocês se vestem elegantemente. Apesar de tudo, Arthur não consegue disfarçar o nervosismo.

- Por Selimon, o que aqueles verrogaris loucos querem com tudo isso? Sua única esperança é que Terry lute por sua causa. Não tenho mais o que fazer por você, mas vou agir perante o rei e usarei ao máximo dos meus recursos. Ou eles levam a palavra de honra muito a sério ou interessam-se demais pelo pagamento que podem exigir. Você não é cavaleiro, não veste armadura, isso nem existe em Eredra. Vão pedir dinheiro ou bens, vão tentar nos extorquir! O portentã não nos mandou aqui para falirmos! Seja como for, será melhor que eu fale antes de você, ou você vai piorar ainda mais a situação.

Na sua cabeça, você não consegue esquecer as atrocidades ditas por Thartalion. Mas como enfrentar um guerreiro como ele?

Todos vocês tomaram banhos merecidos em banheiras nos seus quartos. A maioria preferiu um banho frio mesmo pois é muito quente e úmido em Ludgrim, mas água quente estava disponível, carregada em vasos de cerâmica pelas servas do castelo.

Em seguida, arrumaram-se elegantemente. Alguns traziam roupas compradas em Balinor e reformadas pelos sacerdotes da Catedral de Selimon. Oberyn, por outro lado, encomendou um traje ao próprio alfaiate real e agora desfila com ele. Lezard aproveitou longos momentos reflexivos, sua mente está mais preparada para este ocasião que as dos demais, muito afobados. Anya foi bem tratada por duas servas com um banho de ervas e essências, e elas também foram úteis em lhe explicar como agir para agradar a rainha.

Já prontos, ainda esperavam que um servo aparecesse para lhes guiar até o salão e fazer todas as cerimônias. A ansiedade lhes come a tranquilidade. Markas, no tempo livre, esteve espiando o diário. É uma leitura demorada, o texto está em élfico elaborado e há muitas rasuras que dificultam a leitura, como sujeira e chamuscados. Até que a certo ponto, ele se aproxima de Anya e comenta um trecho logo no início do diário:

- "A corte do rei de Ludgrim não atendeu aos meus apelos. A morte de minhã mãe turvou a vida do monarca. Por dias e depois semanas, ele foi acometido de grave doença e não era capaz de levantar-se da cama. Não soubesse eu o mal e as dores da perda de quem muito se ama, acreditaria esse ser mais um feitiço maligno dos meus inimigos. Eu juro pelos deuses, eles temerão o nome Cirus."

- Não consigo descobrir exatamente a o que ele se refere, as passagens estão faltando ou incompletas. Este diário parece ser o registro de ódio de uma vingança!

Você deixa a taverna do Earl pra trás com um sorriso no rosto e uma dama nos braços. Mas a distração dos seios de Anabel pouco lhe afetou. Bastava lembrar o lugar para onde estava indo e você já podia se sentir nadando em um rio de moedas de ouro! Teria as melhores roupas! Comeria e beberia o que há de melhor no mundo! E os seios de Anabel nem se comparam aos das mulheres que você poderia ter! Talvez fizesse uma competição, assim como a dos menestréis, porém para encontrar a mulher que tivesse os melhores seios!

As ruas estão vazias e a noite está agradável. Não há sinal de chuva e não está quente. Você já podia ver as torres da fortaleza de longe, mas foi só quando chegou que pode se lembrar o quanto aquele castelo é incrível! Muralhas largas e muito altas, fosse e uma ponte levadiça. Há guardas por toda parte e tochas acesas no passadiço. Como passar por tudo isso e ainda carregando tanto ouro? Bom, não há tempo para pensar, um dos guardas da ponte está falando com você:

- Quem são vocês e o que querem aqui?

O maranense começa a esfregar em você um ramo de ervas de cheiro forte e desconfortável.

- Acredite, seu cheiro é pior do que o destas ervas.

Roderick já se encontra pronto, ainda conversando com você.

- Mãos nuas? Thartalion, você não é um bandoleiro qualquer, um criminoso que se esconde nas florestas. Guerreiros de verdade lutam com armas! Decide-se a verdade na ponta da espada e nada menos. Eu prefiro uma bela maça para quebrar os ossos atrás de qualquer malha ou placa. Não sei o que o rei irá decidir, mas provavelmente não será até a morte, não se preocupe. Se for matá-lo, que faça isso durante a noite e longe de todos. Não deixe que ninguém descubra que foi você e não terá grandes complicações.

Ele finalmente examina o resultado:

- Parece bom, deve bastar. Verifique se o gládio está correndo livre na bainha. Prefere uma espada maior? Posso conseguir com os outros guerreiros. Não sei quanto a levar a lança, é um estorvo. Você não tem um pajem ou escudeiro para carregar as armas por você. E quanto ao escudo? A luta provavelmente será sem elmos.

Arthur termina de se vestir e se observa longamente no espelho.

- Isso não faz sentido, por que raios eles desejariam guerra com Eredra? Até onde eu sei, estão tentando uma aliança com os volins, para levá-los a guerra contra Dantsen, mas isso não é tão fácil assim. O motivo deve estar vinculado a vinda deles até a corte daqui. Isso ainda não está claro pra mim. Por que eles enviariam arautos para Ludgrim? Possíveis aliados de Âmien? O rei de Verrogar não é louco ao ponto de querer guerra com Âmien. Este duelo só pode ter a ver com isso. O que é contra intuitivo não acha? Se querem o apoio dos volins, por que atacar um enviado eredri?

Ele termina de se vestir e se volta a você:

- Parece bem vestido para morrer. Vamos já? Ainda nem começou, deve ter pouca gente ainda no salão.

Vocês estão se aproximando rápido demais do castelo e resolvem diminuir o passo até traçarem um plano sólido entre vocês. Apesar da animação, tentam falar baixo para não chamar atenção das casas próximas. As paredes tem ouvidos, e na escuridão da noite qualquer um pode estar escutando a conversa, os seguindo de longe.

Markas comenta para Anya:

- Não quero lhe contrariar, minha mestra, mas minhas interpretações sobre este texto élfico não são as mesmas. Veja o que ele diz sobre a doença do rei: "Não soubesse eu o mal e as dores da perda de quem muito se ama, acreditaria esse ser mais um feitiço maligno dos meus inimigos". Não duvido que seus inimigos estejam na própria corte, mas não acredito que ele fosse inimigo do próprio rei.

Quando Oberyn fala sobre se posicionar em algum dos lados, Thales se espanta:

- Como assim? Quer dizer que os dois brigam e eu tenho que dizer que um deles estava certo? E se eu escolher o lado errado? Bem, eu acho que deve ter um lado menos errado. Por que eles não podem sentar e chegar a um acordo? Não parece certo dois adultos brigarem. E se eu não me posicionar de nenhum dos lados, o que acontece senhor Oberyn?