Parte 2

Anya e Lezard deixam o salão do rei e seguem pelos mesmos corredores até chegarem aos seus aposentos, sem muito papo. Anya não perde tempo e vai direto até o baú onde deixou o kit de primeiros socorros. Talvez a corte a esteja deixando um pouco paranoica, mas ela resolve conferir todos os conteúdos e cheiros antes de retornar. Ao fechar a porta do quarto, pode ver o elfo Lezard com uma expressão triste no rosto se trancando no cômodo. A curiosidade lhe faz gastar uns minutos atrás da porta, até que ela escuta o sacerdote cantar suas orações em élfico. Anya retorna ao salão do rei.

As orações de Lezard são lentas e profundas. Elas progridem calmamente e elevam a fé do sacerdote. Em sua mente, o elfo revive os feitos dos grandes filhos de Crisagom, paladinos da justiça, mártires da fé. As velas tremeluzem, mesmo que vento algum entre no quarto. Seu coração pulsa mais rápido, as mãos suam, as pupilas dilatam e a respiração fica ofegante. Os cantos prosseguem e então vem a dor. Dores físicas, reais. Elas penetram pela pele, avançam pelos músculos e param apenas nos ossos. Lezard ouvira histórias de este mesmo ritual quebrando costelas e provocando hemorragias fatais em casos extremos. E subitamente, termina. O poder mágico retorna, e na exata quantidade para trazer o moribundo de volta a consciência. Seja isso bom... ou ruim.

Enquanto estavam fora, Oberyn teve tempo de se adiantar e avançar até o moribundo. O guarda que vigiava o corpo, o tal Vilbur, ao ver Oberyn se aproximar, faz uma mesura e se afasta um passo. O leva observa o corpo inconsciente. Pele negra, cicatrizes, tatuagens escondidas com maquiagem. Um assassino da pior espécie, sem dúvida. Ainda assim, incompetente. Invisibilidade? Interessante. Combine isso com um veneno potente e esqueça o uso de facas. O ferimento que Bonnie causou não parece capaz de matar o pobre homem se ele for forte e saudável o bastante, mas levará dias até recuperar a consciência. E tem também os cavaleiros, Sir Rumbaldi e Vilbur, logo aqui... Onde estaria Bonnie se metendo?

O Rei Darniar expõe sua proposta de trabalho ao jovem Abadrel:

- Como você deve ter percebido, existe um problema recorrente nas cortes, e ele se chama mentira. Duas versões distintas para o mesmo fato, e quem irá dizer quem está mentindo? Eu tenho especial interesse nesses que convidei esta noite, os heróis que salvaram a Vila de Timor do ataque selvagem, e eles estão incidindo nesse problema também. Eu quero que você os acompanhe e registre todos os fatos com imparcialidade em um diário. Caso aceite, Ricardo, o castelão, lhe fornecerá um livro em branco, penas e tinta e eu avisarei os heróis de seu novo companheiro. Minha proposta é de duas moedas de ouro por semana de trabalho, e estou disposto a pagar um adicional gordo se seu trabalho o meter em aventuras perigosas como estas vividas por eles. Isto, é claro, dependerá do resultado dos seus escritos. Pode começar com aquele ali no canto, Bonnie. Qual a sua resposta?

Enquanto Sir Jozias ignora a pergunta de Bonnie perdido em pensamentos enevoados, Terry retorna com seu apoio incondicional. Bonnie pode observar melhor o salão do local onde está. Nas mesas comunais, nobres burocratas se concentram mais em uma e nobres guerreiros se concentram mais na outra. Na mesa do rei estão as personalidades mais importantes, e é perceptível a inimizade entre os sacerdotes de Crisagom e Crezir. O bardo atrapalhado conversa algo com o rei. E Oberyn, ah Oberyn, está investigando o maldito do Nierom. Falta só ele querer armar uma com o Vilbur ou Rumbaldi. Onde estão Lezard e Anya que não voltam?

Roderick parece bastante impressionado com os argumentos de Thartalion:

- Parece que andou exercitando sua mente tanto quanto seus braços, impressionante. Embora eu ainda não esteja certo do que está acontecendo e um pouco receoso, eu concordo em avaliar a proposta deles. Não vou me expor e meter os pés pelas mãos. Se me agradarem, enviarei você e algumas espadas e arcos. Não gosto de feiticeiros, nossos homens não sabem lidar bem com isso. Em todo caso, não podemos agir livremente neste país sem a autorização do rei. Vou convencê-lo a dar-lhes carta branca, mas evitem mortes. Diga a Bonnie que estou de ouvidos atentos ao que ele tem a me falar, que venha até mim.

No retorno ao salão, Anya resolve esperar por Lezard. Em poucos minutos, ele retorna, e ambos entram juntos.