Parte 2

Apenas Lezard, Sir Jozias e Thartalion conversavam um pouco distantes quando o elfo Terry fez sua análise visual sobre o salão do rei de Ludgrim. Seus olhos treinados de caçador podiam enxergar presas camufladas na floresta com facilidade, mas aquela situação era estranha demais para que ele pudesse tirar vantagem de sua capacidade. Os lordes e guerreiros da corte conversavam entre si, alguns de pé, outros nas mesas, mas Terry não conseguia ler suas expressões.

E o bardo perambulava pelo salão.

Em seguida, Bonnie se deslocou até Lezard, Sir Jozias e Thartalion e conversaram bastante, secretamente. Mas foi Anya e Terry se juntarem a eles que a conversa discreta teve de ser abandonada e o grupo se tornara grande demais. Eles conversaram bastante entre si até que Thartalion os deixasse para retornar a Lorde Roderick Karp.

E o bardo perambulava pelo salão.

O lorde verrogari encerrava sua conversa com Oberyn:

- Ele o é. E talvez nem o saiba. Talvez não seja de sua escolha. Mas um aliado nosso é inimigo de um aliado dele, o que torna dele nosso inimigo por conveniência.

Quando Oberyn já retornava para a mesa menor, Thartalion o aborda convocando-o, e aguarda sua resposta.

E o bardo perambulava pelo salão. E enquanto tudo isso se desenrolava, o rei tinha uma conversa aberta com seus conselheiros.

- Estão aqui reunidos pelo menos cinco sacerdotes de grande poder, capazes de operar milagres que vão muito além do que curar as feridas de um moribundo. Entretanto, eu vejo os cinco se recusarem a fazer isso e compreendo seus motivos. Vai contra seus credos, dogmas e leis invocar os poderes divinos para ajudar alguém acusado de feitiçaria e, possivelmente, um assassino. Eu já digo: se for esta a decisão de vocês, eu vou suspender este julgamento até que o moribundo recupere a consciência, mesmo que isso demore dias.

Ewen Arkel e o Clérigo de Prata fazem um sinal para que Lezard se aproxime da mesa onde estão.

E o bardo para. Não foi difícil reunir informações sobre os convidados do rei. Eles são os estrangeiros salvadores da Vila de Timor, ao Sul, do ataque orc surpresa. Os aqui presentes são: Anya de Maginor, maga consertadora de ossos que nunca esteve numa corte antes; Terry de não-se-sabe-onde, elfo florestal que revelou a pouco ter perdido a memória antes do ataque, aparentemente conhecido de Aeron Petar, grão-mestre de Crezir; Bonnie Dilinguer, o atrasado desrespeitoso que esconde o jogo de toda a corte, mas ligeiro com a língua; Lezard Elanor, elfo dourado sacerdote de Crisagom, discípulo do grão-mestre Ewen Arkel de Crisagom; Thales de Timor, nativo, jovem rastreador, jovem demais até!; e Markas, meio-elfo de cabelos loiros, mago discípulo de Anya e, ao que parece, discípulo também do Conselheiro Gaelor, aqui reunido.

Sir Jozias entrega os pertences que estavam com Nierom para Lezard analisar: um punhal simples e um frasco com um líquido misterioso. Após observá-los rapidamente, os devolve ao cavaleiro.

Em seguida, Lezard e Terry seguem até a mesa menor juntos. Ao se aproximarem, presenciam Oberyn beijando a mão da Sumo-Sacerdotisa de Maira e deixando-na à mesa. Está claro feito água a satisfação no rosto da donzela. Mirian não é mais moça, mas a idade não lhe trouxe confiança ao tratar com a família real. Certamente, Oberyn a encantou com seu charme de príncipe das areias. A Rainha e o Príncipe, sentados à mesa, parecem indiferentes a situação. Oberyn passa por Lezard e Terry com um aceno de cabeça e segue para junto de Bonnie.

Enquanto Bonnie conversa com Anya e Oberyn, Abadrel chega próximo a mesa menor e pode presenciar uma situação interessante. O Rei Darniar, na tentativa de fazer uma julgamento justo, deseja ouvir as declarações do suposto assassino, cujo corpo inconsciente está largado ao chão. Para tanto, ele clama pelos abençoados sacerdotes presentes capazes de curar o moribundo. Contudo, este pedido coloca os Escolhidos dos Deuses em situação desconfortável. Eles estarão se arriscando a operar milagres para salvar a vida de um feiticeiro ou a falhar com um pedido do seu rei. O bardo escuta a conversa entre o Clérigo de Prata, o Patriarca de Crisagom, e o elfo dourado Lezard:

- Lezard, meu amigo - começa Ewen Arkel, o Grão-Mestre de Crisagom - Eu sei que em um primeiro julgamento, é natural que nos recusamos a invocar os poderes de Crisagom para salvar a vida de um feiticeiro e assassino, mas devemos reconsiderar a situação.

- Aquele homem no chão não foi julgado ainda, nos o devemos tratar como um igual, pecador e inocente - o Clérigo de Prata se explica - Nosso pai nos ensina o caminho da Justiça, e não podemos nos permitir levar por preconceitos. Só devemos puni-lo após sua condenação. Não somos camponeses queimando bruxas.

- Temo que haja uma implicação política muito maior por trás, Lezard. Nenhum dos sacerdotes de prestígio aqui quer correr o risco de sujar seu nome, sua reputação. Mas você... o rei acabou de lhe conhecer hoje. Não seria tão terrível se cometesse um erro por... inocência, digamos. Além de ser uma vantagem contra Aeron Petar.

Em outro lugar da mesa, Abadrel também escuta a conversa entre Terry e Aeron Petar, o Grão-Mestre de Crezir:

- Ora essa, você está muito mudado mesmo. Pra começar, você jamais veio até mim pedir por conselhos. Você é mais velho e mais experiência do que eu. Por outro lado, minha ascensão me levou à corte nos anos recentes, e você jamais abandonou o campo de batalhas. É compreensível seu despreparo aqui na corte. Se quer saber o que o Terry que conheci faria, eu lhe direi. Ele não pensaria duas vezes em apoiar o seu companheiro de armas, e derramar sangue por ele, e conservar sua honra pelo aço da espada. Cortes e julgamentos não são para você, rapaz. O único julgamento que lhe importa, ou importava, era o seu próprio. E não duvido que sua atitude aqui fosse a de rir na face do Rei de Ludgrim caso a dele fosse diferente da sua. Mas, é claro, o Terry que eu conheci não se preocuparia em comparecer a uma corte, fosse ela humana, élfica, ou mestiça.

Abadrel percebe a existência de uma rixa entre os dois sacerdotes-de-armas. Aeron Petar parece permitir-se falhar com o pedido de Darniar para poupar-se de uma falha de julgamento, se o moribundo for mesmo um feiticeiro e assassino. Além disso, ambos são Conselheiros do Rei e trocam olhares severos sem nunca dirigirem a palavra um ao outro. E quando Abadrel percebe, já é tarde. O Rei Darniar está de olhos fixos nele.

- Bardo - ele já fala em voz reduzida, não desejando anunciar nada para sua corte, querendo apenas uma conversa informal - Aproxime-se. Você certamente estudou em alguma confraria ou algo do tipo. Deve ser versado no registro e na escrita. Talvez eu tenha um trabalho para você, se estiver interessado. Pagarei pelos seus serviços, é claro.

Após isso, Anya já teve sua conversa com Bonnie e retorna para a mesa menor, onde visualiza Terry com o amedrontador Grão-Mestre de Crezir e Lezard com os outros dois sacerdotes de Crisagom. Ela pode analisar atentamente agora o perfil do rosto do Clérigo de Prata. Azrael... Azrael Arkel, seu nome. É, sem dúvida nenhuma, um jovem muito bonito. Parece-se muito com o pai, na cadeira ao lado. E além de toda a beleza do rosto - e do corpo atlético - existe uma aura quase sinistra nele. Suas expressões são sempre neutras, como se nada o impressionasse ou intimidasse. Uma paz e pureza desumanas. A sensação, apesar de boa, lhe incomoda um pouco. Anya, sem perceber, começa a pensar em como suas vidas provavelmente são diferentes. Ela, lidando com moribundos em um hospital, a maioria soldados nada honrados feridos de morte em batalhas, e ele envolvido na sacralidade de uma religião.

Ao se aproximar de Gaelor, vê que ele conversava com a Rainha Elorá, e decide sentar-se ao seu lado e aguardar. Não deu pra descobrir o conteúdo da conversa, mas a Rainha de Ludgrim certamente respeita muito as opiniões do elfo dourado e o reverencia. Após eles terminarem, Anya expõe suas falas e ele responde:

- Anya, espero que não se chateie com minhas palavras sinceras. Não sou mago ordinário. Sou Conselheiro do Rei de Ludgrim nos assuntos da magia e acima disso sou um elfo, alto mesmo entre os da minha raça. E você sabe bem que desempenho outras atividades que requerem minha total cooperação, as quais não menciono aqui. E não devo ser confundido com outra coisa sequer que não isso. Não me meto em assuntos inferiores ou indignos de minha participação. Se for para me incluir neste assunto que seja algo relevante ou de minha função. Esteja ciente disso em todas as situações.

Então um guarda se aproxima de Anya, e ela o reconhece como o guarda que protestou contra Bonnie, Vilbur ou algo assim.

- Minha senhora, com a sua licença, Sir Rumbaldi autorizou que examine e medique o invasor. Mas não tente nada suspeito, estaremos de olho em você.

Anya percebe que a expressão de Vilbur não é nada agradável. Sua afiliação com Bonnie, o fato de ser uma médica e estrangeira, tudo deve ter cooperado para piorar a visão que ele tem dela. Pode decidir o que fazer, fica na mesa e dialogar com Gaelor ou investigar e tratar Nierom.

Oberyn encerra sua curta conversa com Bonnie e retorna para a mesa menor, sentando-se ao lado da Sumo-Sacerdotisa Mirian. Ele vê Anya, que conversava com Gaelor, sendo abordada de maneira não tão agradável por Vilbur, o guarda que protestou contra Bonnie. Vê também Terry dialogando com Aeron Petar e Lezard com os sacerdotes de Crisagom. AbaLúcios, o bardo louco, está conversando algo com o rei. Nierom não estava na sua trajetória, mas pode aproveitar agora e ir junto de Anya.

Nesse tempo todo, Thartalion pode observar a todas essas cenas de longe, apesar de não saber exatamente o conteúdo das conversas. Roderick o escuta atentamente antes de responder:

- Entendo... Que tipo de ação e que tipo de suporte eu posso oferecer a eles? Eu preciso conhecer todos os detalhes daquilo que estarei me envolvendo antes de participar, é claro. Tem em mente algum tipo de vantagem que podemos obter ao ajudá-los? Minha intenção inicial era obter relatórios e informações confidenciais deste reino e da sua fronteira sul a partir deles, informações de pouco conhecimento que somente eles teriam. Mas eles não estão cumprindo com minhas expectativas. E não se preocupe com Oberyn, ele é nosso principal aliado aqui. Tome cuidado com aquele sacerdote Lezard. Sacerdotes não afiados com a língua, então mantenha sua mente afiada também. Não fica bem você andando com ele. Lezard é simpatizante do inimigo de nosso aliado aqui, o Grão-Mestre Aeron Petar. Quanto a me reunir com eles, eu não sou convidado a me sentar àquela mesa menor, teríamos de fazer isso em outra oportunidade, em outro local.